quarta-feira, 7 de novembro de 2012

HOMENAGEM A MANUEL DA SILVA MOUTINHO...


No dia 4 fez um ano que Manuel da Silva Moutinho terminou o seu percurso terreal. Associámo-nos, com sentido de dever, à iniciativa da Família de lembrar, com saudade, a obra que construiu, o legado que deixou…

O nosso contributo para perpetuar a memória do exemplo de vida desse valoroso discípulo de Cristo é minúsculo, quase um grão de areia na imensa praia onde estendeu o seu saber, onde deixou a sua marca…

Quando soube que nos deixara, comprometi-me a erigir-lhe um memorial. Dei à estampa Manuel da Silva Moutinho, um padrão da igreja bíblica. Desse exercício de reconhecimento e homenagem falei para os que se quiseram associar à iniciativa da Família.



Estará, certamente, em breve disponível o registo dessa iniciativa, também cultural, que mereceu o apoio da Câmara Municipal de Aveiro, em cuja Biblioteca decorreu. O nosso contributo ficará ao alcance de todos. Deixo-vos um esboço do que tinha preparado para me orientar… O que disse ficou aquém dele ou foi muito para além dele… Ei-lo:

«Comprometi-me com todos quantos viessem a este evento que ouviriam de mim “umas palavras sobre quanto foi importante para mim escrever este livro”.

Por isso, se falasse do livro propriamente dito, quebraria esse meu compromisso e eu gosto de honrar a palavra dada!

O homenageado não me pediria mais depois do que escrevi sobre a sua vida e obra em Manuel da Silva Moutinho – Um padrão da igreja bíblica, agora apresentado pela Letras d’Ouro. Está lá tudo (quase tudo) o que interessa aos leitores. E são eles que avaliarão esse trabalho.

A nossa obra, seja qual for, mais ou menos reconhecida socialmente, deve ser valorizada pelos outros, pelos destinatários dela.

Objectivamente, um escrito tem destinatários directos, que são aqueles a quem pensa o autor poder imediatamente ser proveitoso. Mas, às vezes, acontecem surpresas e o universo dos interessados alarga-se de tal modo que a apropriação tende a ser universal.

Sinceramente, gostaria que este livro interessasse aos que conheceram o pr. Manuel da Silva Moutinho, aos que foram seus amigos, aos que foram seus irmãos na fé, aos que gostavam das suas prosas, dos seus versos, das suas prelecções, das suas músicas, da sua maneira de ser, de liderar, de servir, de partilhar, de ensinar e de muitas outras facetas da sua personalidade e competências.

Mas, essencialmente, gostaria que o livro entusiasmasse os que viram nele um exemplo de homem estudioso das Escrituras, apaixonado pelo trabalho de as fazer conhecidas e praticadas.

Todavia, só mais tarde, quando for possível recolher as opiniões dos leitores se saberá que caminho o livro percorreu e a que mãos e corações foi parar!

Esses terão a palavra decisiva, definitiva. Leram, reflectiram, fizeram um juízo (por mais pessoal e subjectivo que seja, é sempre esse juízo que vale para a avaliação do trabalho do autor e é pela soma desses muitos juízos que aguardo, serenamente, para saber quão importante o livro foi para os outros, os meus outros, aqueles que quis trazer para o rol dos que não morrem, como o pastor MSM).

Seria estultícia minha falar da obra, ainda que me limitasse a relembrar o que nela está dito, tarefa sempre fácil. Aprendi há muito tempo que ajuizar em causa própria (e digo ajuizar, não advogar, porque então ainda seria mais evidente o desajuste…) é sempre temerário… O juízo nunca será justo pois se receia sempre que tratando-se dum interesse próprio se deve ser mais exigente (e pecamos por excesso) ou mais condescendente (e pecamos por defeito).

Outros farão a apresentação da obra e a sua crítica, que pode ser contundente, sem ser necessariamente destrutiva ou negativa…

Tenho perfeita consciência que a obra não é completa, pois mesmo dentro do plano que lhe traçamos há omissões, e muito menos perfeita… Eu costumo sempre anotar as imperfeições, logo que as vejo e isso só acontece, normalmente, com ajuda, embora não conviva muito bem com isso, em particular quando nos vem à mente que podíamos ter visto melhor, lido melhor, reflectido melhor…

A consciência da imperfeição da obra humana permite fazer alguma coisa, correr riscos, caminhar, sair da rotina…

O perfeccionismo paralisa, inibe, limita, rouba-nos a dinâmica própria da vida… O perfeccionismo exige obra sem mácula, completa, não susceptível de crítica.

O que interessa é o mérito da obra de MSM (ou, espiritualizando, o mérito da obra que Deus através dele fez…).Eu não falo deste meu trabalho, como tinha dito... mas não resisti a dizer-lhes que ele é incompleto e imperfeito.

Será apenas um começo, um primeiro passo, um gatinhar para a realização do que está por fazer para honrar a memória de MSM, reafirmando o estatuto que já é seu: o da imortalidade!

Sim, no sentido em que ele cria e ensinava (não morremos, vamos ao encontro da eternidade) mas também no sentido de que está na galeria dos heróis da fé, em cujo exemplo nos podemos e podem as gerações futuras inspirar-se.

A galeria dos heróis da fé pertence às pessoas comuns que quiseram ouvir a voz de Deus e obedecer-lhe. Não se idolatra quem creu, segue-se-lhe o exemplo!

Não é taxativa a galeria de Hebreus 11, embora tenhamos muito mais em conta o exemplo desses heróis que não vimos em carne e osso…

Por preconceito, tememos biografar os que conhecemos e já partiram, os que morreram na fé. Preferimos falar do testemunho doutros que viveram noutro contexto e realidade; também nesta matéria nos inspiramos mais no que vem do estrangeiro, fazendo jus ao que se diz do profeta na sua própria terra ou dos santos que só fazem milagres em terra alheia…

Ora, precisamente por isso, é que eu só quero falar da importância que teve para mim escrever este livro!

Eu sei que não há perfeitos, nem um santo o é! Nem dos que estão na galeria de Hebreus se diz que eram perfeitos, quanto mais dizer isso dos santos que conhecemos!

Mas o exemplo dos que nos inspiraram e encorajam é que conta! Basta que sejam santos! Que vivam entre os outros santos ou não, sem receio de moléstia!

Ora, não sendo um dos amigos chegados do Pr. Manuel da Silva Moutinho, conheci-o numa época muito importante.

E num contexto social com semelhanças incríveis no que tange à vivência da infância e da adolescência, apesar de nos separar uma geração.

Eu nasci num lar de operários, saía o mundo dos escombros da 2ª Guerra Mundial. O pastor Moutinho nasceu quando a guerra estava no começo, também num lar de operários.

Não me foram proporcionadas, na altura própria, condições para estudar além da instrução primária; a ele também não.

Eu ainda tinha uma avó, com casa própria, viúva, mas com uma pensãozita e uns cobres duma renda. Ela podia fazer esse esforço e queria fazê-lo; mas fê-lo a favor do meu primo Fernando, que não estudou para além do ciclo inicial na Escola Industrial…

O pastor Moutinho também não teve essa oportunidade. Ambos fomos dados ao mundo do trabalho, ainda crianças.

Ele tinha sede de aprender. E aprendeu para ser ministro do evangelho!

Quando o conheci ele já era ministro do Evangelho e eu queria ser como ele. A sua vida servia-me de exemplo. Ele andaria pelos 28 anos, pelos 29… e falava ao povo com entusiasmo e saber acerca do plano de Deus para salvar o Homem, tocava e cantava com alma…

Eu teria 13, 14, 15 anos e gostava de ser como ele!

Os horizontes de Manuel da Silva Moutinho abriam-se quando estava em Lisboa, para estudar, na Escola Bíblia…

Os meus começaram a alargar-se quando idealizei África e, depois, quando lhe vi as potencialidades…

Mas também estudei em Lisboa, na Escola Bíblica…

Já repararam nas semelhanças de percurso!

Por isso, escrevendo esta obra, revi-me e trouxe para o presente o meu passado. O mais importante não são as perseguições de que fomos alvo por causa da preferência pela igreja bíblica… (Ah, e se isso era relevante quando tínhamos 12 anos, 13, 14!…). A maior importância está no facto do Evangelho de Jesus Cristo nos ter permitido, muito cedo, ver o mundo com outros olhos, de olhar para o futuro com esperança…

Foi o conhecimento e prática do Evangelho que marcou o rumo de MSM. E ele quis percorrer o caminho da sua opção por Cristo até ao fim. Por isso estudou, estudou… aprendeu, aprendeu… batalhou, batalhou sempre com denodo pelas suas convicções…

Quando eu tinha 15 anos, MSM pediu-me uma declaração de fé! Eu estava determinado em ser discípulo de Cristo e fi-la. Mantive até hoje essa lembrança e renovei-a enquanto escrevia esta obra. Aliás, se a lerem, concluirão que momentos como esse eram os mais importantes no trabalho de MSM. Foi o que andou a fazer desde que foi reconhecido como Ministro do Evangelho. São 50 anos a pugnar pela causa de Cristo, a cumprir a ordem para fazer discípulos. Fazia-o de muitos modos, sempre empenhadamente.

Foi o Evangelho que lhe deu o rumo, foi também o Evangelho que modelou o meu.

As letras que estudou mais foram as das Escrituras, em que era mestre. Tinha créditos para vários cursos superiores: na psicologia, na sociologia, na teologia, na história …

Quisesse ele pedir que lhos reconhecessem…

Pôs todo o seu saber de experiência feito ao serviço das comunidades que serviu…

Andou pelo mundo a falar do que sustentava a sua esperança…

Eu perdi-me por outras letras, menos importantes, mas que alimentaram a minha ambição pessoal, a minha realização profissional, o sustento da minha família… também permitiram que fosse útil às comunidades onde servi… Andei pelo mundo a defender causas sem esquecer a matriz do Evangelho que me marcou desde a infância.

Escrever este livro permitiu-me também concluir que a vida dum Ministro do Evangelho consiste mais em levar as cargas dos outros, ser o suporte da vida dos outros, apontar a esperança à vida dos outros… (chorar com os que choram, não é fácil; só por amor, por compaixão…)

Nisso também me identifico com MSM…

Aveiro, 3 de Novembro de 2012»

2 comentários:

  1. Emocionei-me... Não tenho palavras!
    Continuação de todas as venturas e sucessos para a 'Letras d'Ouro' e seus mentores.
    Abraço fraterno - com Amizade e Dedicação,
    AS

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  2. Obrigado, AS.
    Há tantos outros «heróis da fé» a quem gostaríamos de prestar igual homenagem...
    A Letras d'Ouro faria naturalmente muito gosto nisso. Apareçam os autores!

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