quinta-feira, 8 de novembro de 2012

O Acesso ao Direito e o «calvário» dos advogados...


Há tempos escrevi umas linhas aqui sobre o Acesso ao Direito e esse texto foi o que mais interesse teve para os que me acompanham nestas notas esporádicas… Alguns amigos, sob anonimato, «criticaram-me» severamente e até puseram em dúvida que os advogados (eu próprio…) dessem algum contributo generoso para o êxito do regime (o mesmo é dizer, aos cidadãos com menores recursos que se confrontam com a Justiça). Esse texto e comentários podem ser lidos, recordando-se os respectivos considerandos e conclusões.



Preciso fazer esta declaração de interesses: depois da Senhora Ministra ter acusado, por razões políticas, os advogados, sem distinguir o trigo do joio, de malandrice, saí do sistema e só estou a concluir os processos que me tinham sido confiados.

O Ministério da Justiça, entretanto, com muitos meses de atraso, lá foi pagando, sem qualquer pedido de desculpas, os honorários dos processos em que alegadamente dizia ter havido irregularidades… A «marosca», no meu caso, visava apenas protelar o pagamento porque não existia numa razão objectiva, consistente, que impedisse o pagamento, nos termos da lei…

Agora, um simples caso prático para se aferir da dignidade do sistema, da equidade das leis e da posição em que se colocam os advogados quando se diz que eles são «malandrecos» e se aproveitam dos dinheiros públicos… e mais epítetos!

Em tempos (já lá vão dois meses…) comuniquei ao Ex.mo Senhor Presidente do IGFIJ, IP que ainda não me tinham sido pagos os honorários referentes ao processo nº, cujo pagamento foi solicitado, através do SINOA, em 28/5/2012.

Foi-me dada, entretanto, a seguinte resposta: «Cumpre, ainda, informar que relativamente aos processos abaixo mencionados, nos termos do artº 28º nº 1 da Portaria nº 10/2008, de 03 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Portaria nº 319/2011, de 30 de Dezembro, a competência para confirmação dos pagamentos de compensação devida aos profissionais forenses é das secretarias dos tribunais ou dos serviços competentes junto dos quais correm os processos.»

Ora, o pedido de pagamento de nomeação isolada de processo foi efectuado 28/5/2012, e, decorridos cerca de (…) meses, ainda não recebi o correspondente montante a título de honorários.

Face à posição do Instituto, solicitei a intervenção do funcionário competente, nos termos daquela disposição legal, no sentido de confirmar o pagamento da compensação que me é devida, e da qual depende o respectivo pagamento.

Através do SINOA – Ordem dos Advogados – Conta Corrente, tomei conhecimento, em 4/10/2012, que o pedido de pagamento de honorários apresentados fora «rejeitado» em 20/9/2012 e estornado. Não me foram comunicados os respectivos fundamentos pelo que não pude tomar posição fundamentada sobre tal decisão de rejeição.

Por causa disso, voltei a contactar, por escrito, aquele alto funcionário, repristinando a «estória», elencando os factos para lhe permitir analisar a situação e, depois, comunicar-me a decisão com fundamentação:

a) Fui nomeado em 9/2/2011 para patrocinar (…) (Apoio Judiciário nº 31082/2011), arguido no processo nº 176/10.9tasxl da 1ª Secção do MP do Tribunal do Seixal;

b) Fui notificado da acusação pública em 27/8/2011, com a anotação do prazo de 20 dias, querendo, requerer a abertura da instrução – artº 287º do CPP;

c) Nela acusava o MP o arguido da prática em concurso efectivo de um crime de favorecimento pessoal, como co-autor; um crime de denegação de justiça, como co-autor; e de um crime de falsificação de documento, como co-autor.

O arguido, contactado pelo patrono nomeado, o ora signatário, disse-se inocente e prestou toda a colaboração para a descoberta da verdade, tendo procedido, arguido e patrono, em conjunto, à análise dos autos de inquérito dirigido pelo MP, da qual resultou, inequivocamente, não haver prova indiciária da prática dos crimes que eram imputados ao arguido.

Por isso, usando dum direito processual e constitucional, sabendo-se inocente, requereu em 17/10/2011, a abertura de instrução, arrolando provas.

Foram realizadas duas sessões com o Sr. Juiz de Instrução, uma para produção de prova e outra para debate instrutório.

Foi proferida decisão em 27 de Abril de 2012 , tendo o Mº Juiz, em relação ao patrocinado do ora subscritor decidido: «Não pronunciar o arguido (…)», decisão que transitou em julgado pois com ela se conformou o MP.

Além daquelas duas sessões de prova, o signatário ainda compareceu à leitura da decisão em 27/4/2012.

São estes os factos.

Não tinha o arguido direito à nomeação de patrono? Tinha.

Não tinha o arguido o direito de, diante duma acusação manifestamente infundada e reclamando inocência da prática de crimes tão graves (afinal, trata-se dum agente da PSP), se defender, evitando a «tragédia» que é estar em juízo inocente e as consequências que as delongas da justiça trariam à sua carreira profissional? Tinha.

Não exerceu um direito consagrado na lei? Exerceu.

Não foi patrocinado pelo patrono nomeado nos termos da lei? Foi.

Não tem o patrono, pelo seu trabalho, o direito à remuneração (legal)?

É essa a questão que V. Exa. decidirá.

***

Até hoje não foi decidido nada!

Provavelmente, decidir-se-á que, nestes casos, tratando-se duma fase facultativa do processo, o advogado não deve ser remunerado… Se quisesse sê-lo, deixasse o processo ir para julgamento e, depois, feitas umas quantas sessões de julgamento, ouvidas não sei quantas testemunhas, cinco arguidos, etecetera e tal, mais uns adiamentos, mais uns quilómetros percorridos, mais não sei quantas horas de trabalho… Fosse ou não o seu constituinte absolvido (às vezes acontece «coisas do diabo» em julgamento…), lá teria direito a pedir o pagamento de honorários, mas só depois do trânsito em julgado que só ocorreria depois que os demais arguidos, eventualmente condenados, percorressem todas as vias de recurso…

Ou seja, «diz» o sistema que o advogado não deve meter-se nessa coisa de dizer que o constituinte é inocente e que não deve ser submetido a julgamento…

Se tiver razão, trabalha de borla!

Diz ainda o sistema que é melhor fazer muitas sessões de julgamento… mas, também diz o sistema, receber pelo trabalho prestado só no fim, depois de muitos meses e anos a trabalhar, a pagar as despesas, as deslocações… enfim, a «alimentá-lo» (ao sistema, claro!) para almejar receber só quando a Srª Ministra da Justiça quiser, mesmo que a Lei estabeleça prazo para o efeito...

Ora digam lá se os advogados não são uns «malandros»!?



Sem comentários:

Enviar um comentário