quinta-feira, 11 de abril de 2024

Da sinalética pública...

    Meu caro Elias Bogalho, fiquei incrédulo diante da manifestação da tua preocupação acerca de tão irrelevantes pormenores, que designaste como «sinais evidentes de discriminação», manifestados numa das tuas missivas, datada de há umas semanas. Não leves a mal dizer-te que são «irrelevantes pormenores»... Não significa que não tenham grande significado simbólico e que não sejam manifestações dum certo «subconsciente colectivo» a que as instituições ainda estão sujeitas, mesmos quando são de natureza pública, eleitas por «voto secreto e universal», como é o caso das Assembleias de freguesia, das Câmaras e Assembleias Municipais, e com base, muitas vezes, em programas nos quais «o religioso» não tem manifestação visível ou directa.

    É verdade e eu próprio já o constatei em diferentes partes do território nacional. Se não vejo nenhuma discriminação no facto dos monumentos religiosos merecerem destaque em diferentes modos de orientar quem chega às cidades, vilas ou aldeias, designadamente para melhor orientar os forasteiros, em particular os estrangeiros, e nisso tu também não vês, é diferente, com efeito, o que evidencias nos «pormenores» aludidos. Em particular nas novas urbanizações, de duas uma: ou as Câmaras Municipais reservam logo espaços para destinar à construção de Templos (destinados à Igreja Católica romana, quase sempre, embora já as há para aí a considerar a construção de Mesquitas...) ou «oferecem» condições especiais de funcionamento em espaços privados, por exemplo, assinalando a presença de «capelas» a funcionar fora dos edifícios destinados especificamente ao Culto.

    Deste-te ao cuidado de, um a um, na área da cidade a que te referes, identificar os lugares de culto não católicos romanos completamente omitidos na sinalética pública. Por contraposição, lá estão as setinhas a indicar «capela católica», aqui e ali, de modo que se torna fácil chegar ao destino e «dar com o nariz» na porta certa, sem erros ou prévias deambulações. É muito assertiva a observação que fizeste ao «Senhor Presidente da Junta de Freguesia de ...» Mas não penses que vais ser compensado do teu esforço. Andaste de rua em rua, depois das buscas que fizeste no Google, a confirmar a existência de outros locais de Culto e encontraste, pelo menos, mais quatro, todos relacionados com a prática cristã protestante. 

A discriminação está no facto de a Junta ou a Câmara (parece que a sinalética é da responsabilidade desta e não daquela) fazer repetida referência à localização da dita Capela (que está instalada e funciona no rés-do-chão de um prédio de habitação à semelhança dos outros locais de culto da localidade) e não assinalar as demais. Na verdade, como bem sabes, estatisticamente, numa população residente de dez mil pessoas, mais de oito mil identificar-se-ão como católicos romanos praticantes e mil como não praticantes... São muitos votos! Aliás, são os votos «que contam» para eleger quem está na Junta de Freguesia ou na Câmara Municipal, mesmo que os cidadãos eleitos sejam, ideologicamente, anticatólicos ou, quiçá, ditos agnósticos e ateus. 

    O que me leva, naturalmente, à tua questão: Afinal o que está na Constituição e nas Leis não é para todos? Ou seja, o princípio da igualdade e o dever dos poderes públicos o respeitarem não é, por si só, suficiente para obstar a que tal discriminação ocorra? Devia ser, tanto mais que o Estado é laico. Se o que prevalece é o interesse de todos, numa comunidade pequena devem estar sinalizadas todas as situações de relevante interesse. Ou será mais relevante assinalar uma Capela do que uma Casa de Oração ou Mesquita? Pois é, Elias, é tudo o questão de percepção política para «localizar» os votos. Diz lá, onde colheste esse exemplo, que para ter sinalética pública é preciso demonstrar capacidade para virar o resultado das eleições autárquicas... E isso não é impossível pois há minorias, desde que organizadas, capazes de liderar o «sentido de voto das maiorias». Vê, pelo exemplo que dás, se os comunistas não são capazes de ficar à frente na disputa eleitoral quando a comunidade se diz maioritariamente cristã, católica romana... Podes reclamar, Elias, podes invocar a Constituição da República e exigir o cumprimento das leis, mas a capacidade de mobilizar quem vote em ti, ou nos que pensam como tu, é muito mais eficaz. Dá é muito trabalho e não sei se, com a tua idade, estás capaz para te envolver nisso.

    Olha, vai reclamando, mesmo que a motivação se centre nestas questões de «menor» importância! Na altura própria, sempre te «orgulharás» do teu voto que não resolverá coisa nenhuma...

    PS: Vai assim, em rascunho, com as gralhas normais da «escrita ao correr da pena».


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