Recordar é essencial no
reforço do alento para viver melhor o presente. Acredito nisto. Em particular
quando as recordações envolvem pessoas e situações que ainda estão a fazer o
percurso da vida connosco. O que vivemos juntos, o que partilhámos, tudo o que
fez parte e envolveu interesses e objectivos comuns pode ser recordado com
vantagens para o reforço da amizade. Sei lá, o passado é decisivo como marco do
que caminhámos, como caminhámos, com quem caminhámos, por que caminhámos, por
que escolhemos andar pelos mesmos caminhos…
Recordar África com amigos
com experiências comuns é salutar, envolve o coração, a alma, a vontade de
manter relacionamentos antigos, que o tempo não esboroou…
Ontem, dia 21 de Maio de
2016, rejuvenesci para muitos dias… Sim, precisamos de rejuvenescer para
envelhecer sem traumas, sem perda do sentido da vida, sem sentimentos de
inutilidade, sem deixar que nos domine o cansaço dos dias… África Minha foi tão
abrangente nas suas manifestações memorialistas que nos deixou matéria de
reflexão suficiente para inebriar a nossa vontade de viver e construir o futuro
– ou ajudando a construí-lo – que nos espera e o dos que não tiveram as nossas
experiências. Recordar refrescou o hoje e entrelaçou experiências que vão
frutificar amanhã!
Estão de parabéns os meus
queridos amigos que tiveram a ideia, que prepararam as condições para uma noite
memorável! África ficou mais nossa (em particular nas preocupações por aqueles
que precisam do alento da nossa experiência…), as amizades ficaram mais vivas,
a vontade de promover o sucesso das iniciativas em prol das pessoas que estão
onde nós estivemos, que pertencem ao mundo que já foi nosso, que desfrutam da
natureza que já nos abençoou, que levam por diante projectos que já acarinhámos, substancialmente aumentou…
África Minha pode ser a
expressão do amor que não deixamos desvanecer…
*
Para a minha participação na
festa, tinha preparado os tópicos que eram mais ou menos assim:
«O passado nunca morre em
nós. Fica sempre presente.»
Prof. Marcelo Rebelo de
Sousa, Presidente da República Portuguesa, Maio de 2016, Moçambique, Expresso
Revista.
1.
Podíamos abordar o tema
partindo da ideia de que a África foi sempre de todos, menos dos africanos.
A visão imperialista e
colonialista dos Estados desenvolvidos e poderosos. Interessava o bem-bom de
África: a fauna, a floresta, o lazer, a riqueza… Evidentemente um bem-bom
associado a algum progresso…
2.
Podemos abordá-lo partindo
duma experiência pessoal. É isso que me proponho em breves palavras.
A minha possessão é
emocional, espiritual, humana.
África não me deve nada, devo
muito do que sou a África. Sou em parte esse passado vivo, que está sempre
presente por causa das memórias.
3.
A experiência no discurso
sobre África é fundamental. Cada um à sua maneira tem uma parte de África em
si: ou porque ela veio ter connosco (a presença dos escravos, a miscigenação
das raças...) ou fomos ter com ela. Eu fui ter com África só sabendo que havia
por lá uma terra para onde foi o meu pai trabalhar ou para onde iam os rapazes
mais velhos servir Portugal…
4.
Qual é a minha possessão da
África?
Apenas o que vivi e os que
algumas pessoas que conheci viveram.
Espaço de liberdade (entrar
no mar em Cascais para viajar 8, 9 ou mais dias era libertador…)
Espaço de sonhos (progresso
social inclusivo…)
Espaço para a partilha
espiritual (as missões como resposta moderna, capaz de abrir horizontes aos
povos sem esperança…)
5.
O que escrevi em Zau-Évua,
Recantos do Mundo, entre laços d’Ontem e José Pessoa. Missionário por vocação é
uma parte do meu passado que não morreu e está presente.
Zau-Évua
fala dos anos da guerra e da juventude perdida;
Recantos do Mundo do minúsculo esforço de uns quantos que serviram os povos e lhes
levaram o Evangelho
Entre laços d’ontem para sublinhar momentos, situações e pessoas.
José Pessoa. Missionário por vocação para também em parte lembrar como em África com pouco
se podia fazer tanto por quem não tinha quase nada…
6.
África Minha, África das
minhas memórias, África que só eu conheço de modo tão singular:
Dela ficaram-me as
recordações da terra e das gentes, da afectividade própria, das relações
humanas mais inclusivas, dos esforços para vencer as barreiras das diferenças
sociais, da cor da pele, da cultura, da religião…
Ficaram-me também as
recordações do desenvolvimento humano que o Evangelho proporcionou aos povos. A
promoção de valores contra-cultura mas de grande significado civilizacional: a
Escola, o Casamento, a Fidelidade, os Direitos laborais, a Família…
Paga quem ama (um
«conto» de entre laços d’Ontem): Jonas,
as relações familiares, a Missão, o amor… Essa experiência diz quase tudo do
que queria que tivesse acontecido (e que aconteça) na África Minha: um mundo de
justiça, fidelidade, verdade, amor!
*
Naturalmente, esse seria o
meu «discurso»… Disse quase o mesmo pondo o rascunho de lado e deixando o
coração falar…
Bem-hajam quantos
participaram!
Foi um grande prazer rever-te. Muito obrigado pelo teu apoio a este projecto. Abraço
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